Tomaz Fantin
A fila na esquina. Olhou para os dois lados várias vezes. Fechou a jaqueta até em cima e baixou o boné sobre o rosto. Pagou e entrou. Dançou, bebeu, namorou:
— Tu torce pra quem? — Na saída do banheiro.
— Pro Grêmio.
— Tá afim de ir ao Grenal?
— Que convite, cara!
— O pessoal vai reunir aqui na discoteca antes do jogo, é só chegar — despediram-se quando começava a tocar Sala do Som do Gilberto Gil.
Acordou de ressaca. Lembrou-se do jogo. O Internacional já era octacampeão gaúcho e bicampeão brasileiro. Fez chimarrão, vestiu uma calça boca-de-sino e uma camiseta azul. Acendeu um Continental sem filtro e rumou para a Boate Coliseu.
Tambores, bandeiras e charangas. Para o Estádio Olímpico. Olhares azuis e vermelhos de ódio pela Avenida da Azenha. A Brigada Militar fazia o cerco, não sabiam se para proteger ou ameaçar.
— Depravados!
— Era só o que faltava.
Sentia mais medo de ser reconhecido do que de apanhar. O gol não saía, mas a Coligay não parava de cantar. Tarcísio errou um pênalti. Aos 42 minutos do primeiro tempo, Iúra por trás de Marinho Peres direto no pé bom do André Catimba que chutou no canto direito de Benitez. O baiano saiu correndo, mergulhou no ar e deu de cara no gramado. Grêmio 1, Inter 0.
No segundo tempo a pressão colorada foi avassaladora, mas a zaga tricolor segurou até o final. Ou pelo menos foi o que pareceu, pois houve uma invasão do campo antes do final da partida.
Grêmio campeão gaúcho de 1977. Era o fim de nove anos sem títulos, assistindo ao rival desfilar uma seleção histórica. Saiu do Olímpico campeão, com a jaqueta aberta e sentindo o vento no rosto. Não estava mais sozinho. Nisso, o moço da noite anterior se aproximou:
— O Corinthians convidou a Coligay para a final do Paulista, faz 23 anos que eles não ganham nada e tá todo mundo dizendo que somos pé-quente. Vamos?
Naquele instante, Gilberto Gil vestindo preto, azul e branco abraçava os jogadores do Grêmio no vestiário:
— Eu sou negro, a lua é branca e o céu é azul — dizia o cantor baiano para uma rádio de Porto Alegre.
