Tomaz Fantin
Há vinte anos, prometi, e nunca cumpri, fazer uma viagem pela América do Sul.
Talvez de bicicleta. Uma guerrilha socialista na América Central? Por que não?
Com a possibilidade de uma revolução de verdade, explorei, pelo Instagram, perfis de viajantes.
Achei alguns casais de motor home. Não servia.
Um italiano que tinha feito a África de bike? Aí sim.
Lá pelas tantas, o perfil contava que o moço tinha sido sequestrado por guerrilheiros em algum país da África Central.
Voltei para os perfis de motor homes. Bem mais tranquilo.
Dirigir uma camionete com cozinha e uma cama lá atrás. Puta canseira arrumar a barraca no final do dia depois de pedalar. Bem melhor um motor home, mesmo.
No perfil, um casal falava de manter a forma durante uma viagem. Não tinha pensado nisso. Se eu viajar uma semana volto com cinco quilos a mais. Viajar pelo mundo, já que não ia ser de bicicleta, me trouxe a preocupação com a forma física.
Era preciso levar os aparelhos no motor home, dizia o rapaz com a barriga trincadinha. A moça mostrou os equipamentos e citou os patrocinadores e as academias que estavam apoiando a expedição.
Olhar as fotos daquele casal se exercitando e pingando de suor em algum lugar da Chapada Diamantina me deixou exausto.
Chamei uma pizza e me atirei no sofá. Também eu não preciso fazer uma viagem ao redor do mundo. Só uma guerrilha na América Central mesmo.
Nisso, chegou minha pizza. O motoboy estava exausto, não de viajar o mundo, nem de olhar os outros viajando pelo mundo, era de correr atrás do próprio sustento mesmo. Sem leis trabalhistas, sem banheiro, sentindo cheiro de comida, talvez com fome. Preso a um celular que controla até o tempo que leva para respirar.
Acabei desistindo da guerrilha na América Central e decidi começar minha revolução através das urnas neste ano mesmo.
E já que não ia seguir um plano rígido de treinamentos, me levantei do sofá e dei uma pedalada pelo meu bairro.